quarta-feira, 20 de março de 2013

Compor


1. António Pinho Vargas (2012) ONZE CARTAS, (início) CARTA 1&2.

Aproveito a colocação da parte inicial desta peça para  tentar - tentar... - tornar clara a minha ideia da liberdade do compositor, derivada do artigo de W.Rihm, On Freiheit, de 1983. Se porventura, na adesão a estes princípios gerais, a minha música passasse a ser muito semelhante à de Rihm algo estaria errado. A liberdade seria uma máscara de uma não-liberdade. Ainda mais profundamente, na querela tonal-atonal que divide ainda o mundo musical desta tradição hoje, esta tomada de posição pela liberdade e pela contingência do acto composicional não significa apenas que "agora" a minha música - como a de outros - pode ser tonal. Outro equívoco. Pode ser tonal se eu "quiser" que seja tonal. Depende. Em certos casos é tonal, ou inclui secções tonais, noutros casos inclui secções atonais e cromáticas. Caso contrário, seria apenas uma opção por um sistema já constituído, sendo totalmente indiferente que fosse cromático a todo o custo ou tonal a qualquer preço. Nem uma coisa nem outra. A música pode ser aquilo que num dado momento, como se ouve na peça (tanto na música como no texto de Calvino) se encontra como "necessidade" e nos permite "constituir-mo-nos neste mundo" como sujeitos. Por isso repito: o mais importante é perseguir no discurso musical "o infatigável trabalho da liberdade" (Foucault).

http://www.youtube.com/watch?v=AzLnVMyXuGM
2. ONZE CARTAS 2012 (final)
O final desta peça é, na minha opinião, avassalador (está também no you tube.) Mas não teria sentido compor uma peça deste tipo, com 11 cartas diferentes, contrastes discursivos sucessivos, tanto no que é dito como na música, com 11 momentos avassaladores. Para além de eu não conseguir fazê-lo, a própria razão de ser da peça, a sua história, a sua ideia, contrariavam esse desígnio. Cada secção, cada "momento", cumpre uma função num discurso global. Chama-se a isto, na minha opinião claro, estrutura narrativa e ela implica uma respiração da forma. A beleza obriga à presença de outras formas de beleza, ou mesmo de não beleza.

http://www.youtube.com/watch?v=7JuxpfMhRuk&list=UUCQkYiK3HEiWo1_9QQ0Lcwg&index=15